domingo, 24 de junho de 2018

Rótulos nocivos no ciclismo.


Ciclista? Bicicleteiro? Cicloturista? Cicloviajante? Ciclista hipster? Modinha? Peba? Forte do fraco? Bruto? Galático? Por que tanta necessidade de rótulos?

Esse é um assunto delicado, pois envolve diferentes perspectivas sobre a mesma cultura. Adianto que o que escrevo é apenas minha observação sob o limitado ponto de vista que possuo, pois posso muito bem ter um dos vícios que abordo neste simplório texto.

Uma coisa que o ser humano gosta é ser melhor que o outro. Prefere inclusive se sentir melhor do que ser, efetivamente. Disputas e rivalidade fazem parte da nossa genética, seja por esporte, por necessidade, por ego ou qualquer coisa que envolva mais de um indivíduo. Vai nos entender...

Lembro que quando tinha uns 5 ou 6 anos e tinha uma Monark Mirim, aro 14. As outras crianças da minha idade não brincavam muito na rua nessa época, mas eu já sabia ir pra escola, padaria, andar sem rodinhas somente pela calçada. Sou grato pela educação inclusiva que tive. Os meninos maiores corriam com suas Caloicross. Tentava acompanhar pela calçada, mas sempre ficava pra trás. Quando cresci um pouco, ganhei uma Brandani Cross de segunda mão, vermelha. Agora com uma aro 20 e mais noção, eu ia pela rua e conseguia alcançar os maiores. A reação deles ao me ver no "pelotão" foi desmerecer meu tamanho e minha bicicleta. Daí eu era o "moleque chato", "bicicleta feia que não é Caloi", entre outras besteiras de moleque. Ou seja, me desmereciam para se sentirem melhores, coisa que era mais consoladora do que aceitar a ascenção de um moleque menor.

Os anos se passaram, virei adolescente e em 1993 arrumei meu primeiro emprego. Na época havia uma efervescência da Moutain Bike no Brasil. A novidade fazia que no nosso imaginário, mtb´s eram de outro mundo. Tudo o que eu queria era uma bicicleta com marcha, que já era algo caro pra caramba. Com um dos meus primeiros salários consegui comprar uma Peugeot 10 usada, que estava pendurada em uma bicicletaria. A Peugeot estava inteirona, recém pintada e muito bonita, porém com mais de 10 anos de vida. No olhar geral, uma bike "ultrapassada".

O cenário mtb na época era simplório perto de hoje. O mercado era quase todo da Caloi. Lembro de alguma coisa da Monark surgindo nas lojas, mas tinham um acabamento visivelmente simplório que aos nossos olhares juvenis, não despertavam interesse. Fora essas duas gigantes da época, encontrava-se alguma coisa importada de qualidade em poucas lojas nas regiões nobres (sei porque eu era office-boy e rodava a cidade). Também tinha muita bike do Paraguai em tudo que é canto. E nesses cantos também surgiam bikeshops, cheias de tralhas importadas.

Uma dessas bikeshops abriu perto de casa e um amigo comprou uma bike moderna, de cromo-molibdênio. Ele se gabava dizendo que sua bike "não era de ferro", que era melhor que alumínio. Isso mesmo! Falaram tanta paroxítona pro moleque que ele acreditava que cromo-molibdênio não era aço, tampouco ferro! Vejam o nível de lorota que os lojistas passavam àquela pobre e endinheirada criança. Afinal, a idéia é vender superioridade, não bicicleta.

Essa loja também fazia passeios noturnos (chamavam-se de night bikers, chupinhando o nome da turma da Renata Falzoni). Certa vez tentei ir, mas alegaram que não podia participar, pois minha bicicleta "não foi comprada na loja" (na verdade bike velha não entrava). O mais engraçado foi que, anos depois, descobri que minha antiga Peugeot também "não era de ferro"! Hahaha! Cromo-molibdênio, numa bike uns 15 anos mais velha? Meu amigo iria jogar sua bike fora, ou o mais provável, se esforçar em desmerecer a minha. Claro que os donos da loja sabiam disso (afinal, diziam-se especialistas), mas jamais abriram a boca. Mais uma vez, pessoas dando um jeito de se sentirem superioras.

Depois dessa fase, fiquei 20 anos sem pedalar e voltei pro pedal em 2013 com uma Caloi Aspen, conforme meu primeiro post, que está aqui. Com o tempo tomei gosto, fui melhorando meus equipamentos, fiz uma cicloviagem linda de 5 dias, outras de um dia e muito pedal pelos 4 cantos da cidade. Criei esse blog e hoje leio muitos blogs, postagens em fóruns, sigo muitos canais de ciclismo no youtube. Ou seja, me intero desse universo e me motivo a pedalar mais cada vez que vejo algum vídeo ou leio um texto bacana. Acho saudável! Mas em todo esse tempo, me incomodam as rotulações que as pessoas se enfiam. Seja para se diferenciar, seja para ostentar, ou mesmo para recalcar.

Não é geral, mas muito comum: pessoas definindo quem pode ser considerado cicloturista, com base nos próprios parâmetros; outros se afirmando ciclistas e apontando quem é bicicleteiro; o cara que pedalou a vida toda que se dói quando vê novatos; tem o ciclista de bike fixa, que se considera o único detentor do verdadeiro prazer que é pedalar; o conceito do peba ao galático;  aquele que critica o ciclista de fim de semana, por se enfeitar todo para andar na ciclofaixa; o speedeiro que xinga o trabalhador que atrapalha seu "treino" na rodovia/ciclovia; aquele trabalhador que chama o speedeiro de veado por ele usar roupa colada; o cara da bike top que vira a cara pro cara da 21v; falar que quem usa bike elétrica não é ciclista; a indignação por ver um monte de ciclistas que surgiram nos últimos anos porque virou "modinha"...

A pergunta que eu faço é: E DAÍ?



O ciclista fantasiado na ciclofaixa fará seu câmbio desregular? E daí que ele não sabe trocar pneu? O trabalhador atrapalhará a performance do speedeiro, ou o cara que é ruim mesmo e procura uma desculpa? E qual o problema em ser ou não veado? Aliás, faz tempo que a vestimenta não é parâmetro de opção sexual de qualquer pessoa. Pagar R$ 300 ou 30.000 numa bike é algo que cabe a quem está pagando, não a quem está olhando. E no que 1, 3, 7, 11, 30, 900 velocidades influenciam no prazer de pedalar? Pra que cagar regra? Se sentir melhor alimentando rótulos vazios só afastam as pessoas.

Cada vez menos eu vejo os ciclistas se cumprimentarem nas ruas. Você cruza o ciclista e ele não te olha nos olhos, está olhando pra sua bike, sua posse. Mentalmente comparando e julgando. Isso é triste, muito triste.

Ninguém é obrigado, mas garanto que um bom dia é um combo: te fará se sentir melhor e ser melhor.

Bom pedal!

quarta-feira, 13 de junho de 2018

Bike aro 29 com 21 marchas? Fuja!

As 29'er estão no mercado há algum tempo, e nos últimos anos elas entraram com força no mercado de bicicletas de entrada. Tudo bem, afinal a demanda gera oferta e as marcas se esforçam para baixar seus preços para atrair clientes. Uma estratégia delas é montar bikes com 21 velocidades, ou seja, 7 marchas atrás e três na frente. Uma tecnologia lá dos anos 80/90, que por ser bastante popular, tem preços menores.

Eu sou mais pesado, tive muitos problemas com o eixos das minhas bikes de 21 marchas. Seus eixos quebravam muito rápido. Em todas elas, troquei o sistema de blocagem pelo sistema de parafusos, pois o eixo sendo sólido se tornava mais resistente. Mesmo assim, eles empenavam com o peso. Agora imagine uma bicicleta de aro 29, que é mais pesada por natureza. Fora a força centrífuga maior daquelas rodonas. Mais difícil usar um sistema que não foi pensado para elas.

Não irei entrar em detalhes sobre a qualidade e a geometria das bikes de entrada, apenas compartilharei minha experiência com cubos e eixos de 21 marchas. Resumindo, minha única dica para quem pensa em adquirir uma 29: fuja das 21 marchas! 

Dou 2 motivos:

1. Você irá sofrer nas subidas.
A catraca de 7 velocidades foi pensada para o aro 26. Num aro 29, que é bem maior, a marcha mais leve corresponderá a usar uma 26 sempre na segunda ou terceira marcha. Pense naquela subida gigante que você terá que encarar sem poder deixar a bike mais leve.



2. Eixo frágil, sujeito a quebra.
Isso vale para qualquer bike com sistema de catraca em cubo de rosca. Sua construção faz com que o eixo seja preso ao cubo muito no centro dele, sobrando muito eixo até prendê-lo no quadro, ou seja, com o peso o eixo empena ou rompe. Pense num varal de roupas. Se você pendurar uma toalha pesada no meio dele, o varal entortará e gerará muita pressão no barbante.

Este é um cubo para catraca de 7 velocidades, que vai rosqueada na parte cromada.
Vejam o quanto de eixo é necessário para prendê-lo ao quadro. Isso fragiliza o sistema.

A catraca vai rosqueada no cubo e o eixo passa aí no meio.
Como fica preso só lá no fundo, o peso o faz empenar.


Portanto, se for comprar uma 29, escolha modelos a partir de 24 marchas.


Um cubo para 24 a 30 velocidades. A roda livre é embutida e o cassete é encaixado nos trilhos. Reparem que o eixo é bem mais integrado ao sistema, minimizando o risco de empenamento.
O sistema do cubo 24v é mais moderno, o ponto de apoio do eixo é muito maior e mais resistente. Seria como colocar aquela toalha pesada perto da base do varal. O barbante entortará bem menos.

Outra vantagem é que se você adquirir uma bike de 24 velocidades, poderá fazer upgrades para 27 ou 30 velocidades sem precisar trocar o cubo.

Nossas ruas são muito esburacadas. Um circuito urbano pode fazer a bike sofrer tanto quanto se estivesse em uma estrada de chão batido. Um eixo moderno e resistente vale cada centavo investido.